sábado, 28 de setembro de 2013

Sombra do meio-dia














Dor ou alegria, sol ou nuvens, para a depressão tanto faz. Quando ela decide atacar, a única defesa é atacar antes, diz autor de best-seller


Quando Andrew Solomon escreveu O Demônio do Meio-Dia, mergulhou fundo nas imagens. Só assim, quem sabe, alguém que nunca viu a cara da depressão poderia entender essa dor. Uma das imagens era a da trepadeira que tomou conta de um carvalho centenário. "Só bem de perto se podia ver como haviam sobrado poucos ramos vivos, e quão poucos e desesperados gravetos brotavam do carvalho, espetando-se como uma fileira de polegares do tronco maciço."

O carvalho centenário era o carvalho da sua infância, e a trepadeira de fato o sugou. A depressão Solomon a viveu na alma, num estágio severo, depois de a mãe morrer num suicídio assistido, após longo tratamento de câncer. "No final, eu estava compactado e fetal, esvaziado por essa coisa que me esmagava sem me abraçar." Esse americano-britânico, a um mês dos 50 anos, tinha 31 na época. Levou mais cinco anos para compor uma anatomia da doença que em 2001 ganhou o National Book Award e em 2002 foi finalista do Pulitzer.

Se O Demônio do Meio-Dia, lançado no Brasil pela Objetiva, emerge aqui nessa semana, é por causa do Dia Internacional de Prevenção ao Suicídio. Na terça-feira foi lembrada a taxa mundial de suicídio divulgada pela OMS: entre 10 e 30 por 100 mil habitantes. O Datasus soltou o número de 9.852 brasileiros que se mataram em 2011. Considerando-se a subnotificação, presume ser maior. No geral, com o que corroboram vários estudos, cerca de 90% dos suicídios estão associados a estados depressivos.

"Depressão e suicídio são entidades separadas que com frequência coexistem, influenciando-se mutuamente", afirma Solomon. Por falta de uma, ele propõe políticas públicas para as duas, com formação de profissionais de saúde e ferramentas na medida para distúrbios ainda sub ou sobretratados.

Nesta entrevista, feita a partir de Cleveland, Ohio, o escritor menciona o novo livro, Longe da Árvore, que será lançado em outubro pela Companhia das Letras. São mil páginas sobre o universo de famílias cujos filhos são marcados pela excepcionalidade. Seu foco na nossa conversa, porém, é o tratamento daquilo com que Solomon precisa conviver eternamente, à espreita de que a trepadeira queira subir novamente pelos seus pés: "Toda manhã e toda noite, olho para as pílulas na minha mão: branca, rosa, vermelha, turquesa. Às vezes parecem uma escrita, hieróglifos dizendo que o futuro pode ser muito bom, e que devo a mim viver para vê-lo".

O senhor costuma dizer que a depressão ceifa mais anos do que a guerra, o câncer e a aids juntos. Em suas palavras, ela pode ser "a maior assassina da Terra". Como explicar a escala do problema?

A variação do estado de ânimo é uma vantagem da evolução da espécie. Sem a capacidade de ser triste, por exemplo, não teríamos o amor como o conhecemos, já que ele contém necessariamente a sensação da perda antecipada, que aumenta nosso apego à pessoa. A depressão é uma disfunção desse espectro. No entanto, como é contígua à tristeza e à ansiedade, é difícil regulá-la. Ainda assim, provavelmente temos mais casos de depressão nestes tempos modernos do que tivemos ao longo da história. São tempos eletrônicos, superconectados e superpovoados, que nos impõem tensões não vividas no passado. Com novos discernimentos, diagnosticamos a doença com mais frequência. E porque temos um tratamento mais eficaz, há um incentivo para que as pessoas se identifiquem com essa condição. Contudo, apesar dessas ferramentas clínicas (drogas, psicanálise, terapia cognitivo-comportamental, terapia eletroconvulsiva, etc), a maioria das pessoas com depressão não recebe tratamento, o que é um desastre para a saúde pública.

Por que não recebem tratamento?

A depressão é, em geral, resultado de uma vulnerabilidade genética desencadeada por circunstâncias externas. Podemos supor que a vulnerabilidade atinja todas as classes sociais - e, em seguida, perceber que a experiência dos pobres é mais estressante e, portanto, deve levar a uma maior taxa de depressão. A questão é que pessoas com uma vida confortável que se sentem arrasadas o tempo todo tendem a perceber a estranheza desse sentimento e procuram tratamento. Já os pobres acham que o que sentem é compatível com suas vidas, e não lhes ocorre que estejam deprimidos. Muitas vezes, nem estão deprimidos por causa de problemas externos, mas a depressão os desvitaliza de tal forma que os impede de melhorar de vida.

Não externar fragilidades também pode dificultar o diagnóstico? Vivemos em uma sociedade que não suporta lamúrias?

Não acho que o lamento tenha alguma vez sido popular. Como um amigo meu disse certa vez, "autopiedade não dá bilheteria". Mas acho que devemos fazer uma distinção entre choramingar num encontro social e identificar a depressão num quadro clínico. Depressão é uma experiência de dor intensa, por vezes tão intensa que a única opção parece ser o suicídio. Buscar tratamento para essa dor é a coisa sensata a fazer. Manter-se em silêncio não traz benefício a ninguém.

A vida virtual e a fragilidade nas relações sociais e familiares podem aumentar o sentimento de vazio existencial?

Sem dúvida. Seres humanos precisam interagir com outros seres humanos; quando interagem principalmente com uma tela de computador ou com um aparelho de televisão, tornam-se alienados e descontentes. A depressão é uma doença da solidão, e aqueles com relações familiares frágeis partem de um lugar ainda mais solitário. Muitas vezes, as pessoas que estão deprimidas acham a interação humana estressante, e se isolam. É importante lembrar que exigir reação de uma pessoa muito deprimida pode exacerbar a doença. Mas fazê-la perceber quão realmente é amada é essencial na sua recuperação.

Há muito charlatanismo nos tratamentos?

Há um charlatanismo sem fim. Mas, às vezes, o charlatanismo funciona. Se você tem câncer no cérebro e alguém disser que ficará melhor se plantar bananeira por 20 minutos toda manhã, você continuará com o câncer no cérebro e provavelmente morrerá com ele. Mas se você tem depressão, alguém disser o mesmo e você se sentir melhor com essa prática, então de fato está melhor naquele momento: afinal, a depressão é uma doença do sentir. Fazendo essa ressalva, acho perigoso perseguir tratamentos alternativos e adiar os comprovados, porque, quanto mais tempo procrastinar o tratamento da depressão, pior ela vai ficar. E tudo que se quer é dar a volta por cima quanto antes. Há pessoas que tomam medicamentos de que não precisam, e há pessoas que não recebem a medicação necessária. Estou mais preocupado com os da segunda categoria, mas ambos são problemas.

O gatilho para a depressão é necessariamente negativo?

O gatilho é geralmente uma forma de estresse, e eventos positivos podem ser tão estressantes quanto os negativos. Uma interrupção de estabilidade, uma ruptura do status quo, tudo isso pode levar à depressão. Algumas pessoas ficam deprimidas quando mudam de emprego, mesmo que quisessem fazê-lo. O mesmo acontece quando algumas se casam ou têm filhos.

Como lidar com a possibilidade de um novo colapso?

A depressão é uma doença cíclica, e a maioria das pessoas que teve um episódio terá outro. A primeira coisa é saber disso e estar preparado. A segunda é certificar-se de que você tem um bom tratamento. Eu, por exemplo, tomarei medicação e farei terapia o resto da vida. Mas, além disso, conheço os sinais de alerta e tento ser sensível a eles. Quando começo a me sentir mal, volto a ser rigoroso com meus horários de sono, com os exercícios, com tensões desnecessárias. É importante planejar essas estratégias enquanto você está se sentindo bem, caso a depressão volte a bater à porta. Às vezes, com terapia e medicação, é possível evitar uma recaída, mas muitas vezes não é. Quase sempre é possível, no entanto, que as recaídas sejam menos frequentes e profundas.

A depressão varia de cultura para cultura?

Na essência, é a mesma. Eu me propus a quebrar a ideia de depressão como uma doença da modernidade ocidental e de classe média, demonstrando que existe ao longo do tempo (Hipócrates fez uma das melhores descrições do distúrbio); que existe em todas as culturas (fui olhar a depressão entre os inuits da Groenlândia, entre os sobreviventes do Khmer Vermelho no Camboja e examinar rituais tribais para tratar a doença na África Ocidental); e em todas as classes. A ansiedade aguda pode ter um foco diferente, por exemplo. Mas sua característica fundamental é surpreendentemente consistente.

No ano 2000, 815 mil pessoas tiraram a própria vida. No Brasil, tivemos um aumento de 30% na mortalidade por suicídio entre os mais jovens, homens especialmente, nas últimas duas décadas. Mas pouco se trata do tema. O tabu em torno do suicídio pode comprometer o diagnóstico da depressão, considerada uma de suas principais causas?

É verdade: quase todo suicídio é resultado da depressão. Algumas pessoas cometem suicídios racionais porque têm, por exemplo, uma doença terminal avançada e não querem morrer sentindo uma dor insuportável. Mas, em geral, o suicídio é o ponto final de uma depressão não tratada. A natureza epidêmica do suicídio é resultado da nossa falta de cuidado com a saúde mental, a visão corrente de que as doenças mentais não são doenças reais. Elas são doenças reais, e elas matam pessoas. Prevenção é um imperativo urgente para os governos e agências de serviços sociais. As pessoas podem ser resgatadas da beira do precipício.

A depressão cresce entre as crianças?

Sim, em parte pelas razões pelas quais está aumentando em toda a sociedade, mas também porque as crianças estão sob mais pressão, são mais superestimuladas, mais levadas a se movimentar de um lugar para o outro e de escola para escola. Isso acontece porque os pais estão ambos trabalhando fora, e as crianças têm ficado com uma variedade de cuidadores que as amam menos que os pais. Isso acontece por causa do colapso da família.

No seu último livro, Longe da Árvore, o senhor conta histórias de pais que não apenas aprendem a lidar com seus filhos deficientes como acham um significado profundo em fazer isso. Por que escolher esse tema?

Eu sou o filho gay de pais heterossexuais, e sempre me impressionei com quão difícil era para a minha família me entender. Se compartilhássemos a mesma qualidade definidora de identidade, talvez fosse mais fácil. Tempos depois, numa missão jornalística, descobri que a maioria das crianças surdas nasce de pais que ouvem, e que elas se aproximam entre si na adolescência. Em seguida, um amigo de um amigo teve uma filha anã, e percebi que a maioria dos anões nasce de pais de estatura padrão. Enfim, constatei um padrão de pais que têm filhos profundamente diferentes deles, e vi que todas essas crianças tinham algo em comum, assim como essas famílias tinham semelhanças entre elas. Quando se conhece a experiência de negociação entre pais e filhos tão diferentes, de repente se está falando da maioria da humanidade. Nossas diferenças nos unem. Eu queria escrever um livro não sobre o sofrimento, mas sobre o amor - sobre quantos tipos de amor podem prosperar mesmo quando as circunstâncias parecem se armar contra eles.

FONTE: Mônica Manir - O Estado de S. Paulo

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Paris Jackson é levada ao hospital por tentativa de suicídio
















Debbie Rowe, mãe de Paris, confirmou a informação ao Entertainment Tonight.


Paris Jackson foi levada ao hospital depois de uma tentativa de suicídio. Segundo o site "TMZ", a filha de Michael Jackson deixou sua casa em Calabasas, na Califórnia, de maca às 2h e foi levada de ambulância para um hospital próximo nesta quarta-feira, 5.
Ainda segundo o site, a chamada para a emergência foi feita às 1h27 e reportava uma possível overdose. No entanto, Debbie Rowe, mãe de Paris, confirmou a tentativa de suicídio ao programa "Entertainment Tonight" e disse que ela está internada depois de ser admitida no hospital com vários cortes no pulso. Debbie disse ainda que Paris tem tido alguns problemas.
Fontes do Entertainment Tonight próximas aos Jacksons revelaram que a tentativa de suicídio aconteceu depois que Paris não teve autorização para ir a um show do cantor Marilyn Manson em Los Angeles nesta quinta-feira, 6. Ela teria se trancado em seu quarto depois de bater a porta.
O site "Radar Online" informa que Katherine Jackson, avó e guardiã legal de Paris, está no hospital com ela. Uma fonte da publicação disse ainda que os médicos acreditam na total recuperação da menina. O advogado de Debbie divulgou um comunicado da família sobre a internação: "Agradecemos a preocupação de todos com Paris e pedimos respeito pela privacidade da família neste momento."
Já o "TMZ" relata que esta não foi a primera vez que a menina tentou suicídio: "Ela tentou o mesmo no passado, mas desta vez foi bem mais sério. Não é um pedido de ajuda." O site também mostrou imagens de Paris com machucados no pulso. Segundo a revista "Us Weekly", Paris sofre de depressão: "Ela tem sérios problemas de depressão e muito por causa da morte do pai. É bem real e muito triste. Ela tem estado bastante deprimida e não consegue dormir à noite. Fica acordada a noite toda", disse uma fonte da publicação.

Na terça-feira, 4, ela postou mensagens enigmáticas em seu Twitter: "Eu me pergunto por que as lágrimas são salgadas" e citou um trecho de "Yesterday", música dos Beatles: "Ontem parecia que meus problemas estavam longe, agora parece que eles estão aqui para ficar."
Ela aparece ensinando truques de maquiagem em um vídeo postado no YouTube no dia 31 de maio. Nas imagens, Paris zomba de si mesma algumas vezes: "Sim, eu tenho acne", diz. Ela também comenta que tem um gosto "terrível" pela música. Em outro trecho, ela brinca com a aparência e diz para as pessoas "não se chocararem ao vê-la de cara lavada".
Em 2001, Debbie abriu mão dos direitos de criar seus filhos, mas recentemente, Paris retomou a relação com a mãe. As duas foramfotografadas juntas em um haras na Califórnia e repetiram o passeio dias depois.
FONTE: EGO

terça-feira, 4 de junho de 2013

Obama quer ajuda de Hollywood para reduzir preconceito contra doenças mentais












A atriz Glenn Close vai se reunir com autoridades para pensar em estratégias que ajudem a divulgar informações sobre o problema

Um dos objetivos é fazer com que filmes retratem o problema com mais precisão


O presidente Barack Obama recorreu à ajuda da atriz Glenn Close e de especialistas em doenças mentais para pensar em estratégias que ajudem a divulgar informações sobre o assunto. Um dos objetivos é incluir a discussão na indústria de Hollywood.

Nesta segunda-feira, a estrela do seriado "Damages" se reúne na Casa Branca com o vice-presidente americano Joe Biden, a secretária de Saúde Kathleen Sebelius, o secretário de Educação Arne Duncan e o presidente da Associação Nacional de Emissoras, Gordon Smith. Em pauta, acabar com os estigmas em torno de problemas mentais e incentivar as pessoas a buscar tratamento.

Close fundou a ONG "Bring Change 2 Mind" ("Traga mudanças à mente", em tradução livre). Sua irmã tentou se matar várias vezes antes de ser diagnosticada com transtorno bipolar. Além disso, o sobrinho dela foi diagnosticado com transtorno esquizoafetivo.

Já o ex-senador Gordon Smith escreveu sobre o suicídio do filho aos 22 anos no livro "Remembering Garrett: One family’s battle with a child’s depression" ("Em memória de Garret: A batalha de uma família contra a depressão de um filho", em tradução livre). No Congresso, Smith ajudou a criar medidas contra o suicídio de jovens.

Entidades relacionadas à produção audiovisual vão fornecer ferramentas para que produtores de cinema e televisão retratem com mais precisão os desafios enfrentados por pessoas com doenças mentais.

"A mídia e os profissionais de entretenimento podem ter um papel importante no entendimento público de doenças mentais", acredita Brian Dyak, presidente do Conselho das Indústrias de Entretenimento. "Descrições imprecisas de indivíduos com esse problema podem potencializar a discriminação."

"A conferência vai reunir pessoas de todo o país, incluindo representantes do governo, autoridades de saúde, educadores e líderes espirituais para discutir como podemos trabalhar juntos para reduzir o estigma e ajudar milhões de americanos que lutam contra problemas mentais a entender a importância de procurar ajuda", explicou a Casa Branca, em comunicado.

FONTE: O GLOBO

terça-feira, 28 de maio de 2013

Donny Hathaway: O legado de uma alma em conflito














No dia 30 de janeiro de 1979, Donny Hathaway era encontrado morto na calçada em frente ao Essex House Hotel, em Nova York. A partir daquele instante, uma série de especulações sobre o trágico episódio ganhava corpo. Mero acidente ou ato premeditado? O jovem músico havia caído ou se atirado da janela do edifício? Todos os indícios guiavam a investigação policial à hipótese de suicídio. Aos 34 anos e ainda sob o impacto do sucesso, sua prematura morte chocou a comunidade negra e a todo o mercado fonográfico, que, naqueles anos, celebrava a efervescência da soul music a bordo de fenômenos vocais como Marvin Gaye e Stevie Wonder. Da noite para o dia, familiares, amigos e fãs questionavam-se sobre os motivos que o teriam levado a tal ato e estado de desespero. O quão atormentado seria o cantor e autor de melodias tão tristes e profundas, como outras tão eufóricas e dançantes?
Resposta alguma servia para preencher a lacuna de informações que o ostracismo de seus últimos anos de vida havia instaurado. Apenas os mais próximos ventilavam alguma noção sobre os embates psíquicos que haviam fragilizado sua saúde mental. Mais do que um dos maiores cantores da história da música popular moderna, embalado pelo peso de um grave sísmico e a leveza de agudos altivos e firmes, Hathaway era compositor, arranjador e produtor musical. E é pela qualidade de seus múltiplos dotes que, 40 anos depois da sua morte e três décadas após o lançamento do seminal Everything is everything (1970), sua contribuição à música pop dos anos 60 e 70 até os dias de hoje é exaltada.

“Todos que o escutavam concordavam que Donny era um grande cantor. A Atlantic Records, Curtis Mayfield, King Curtis... Todos entenderam que se tratava de um gênio”, diz o arranjador e amigo Harold Wheeler, em depoimento ao primeiro documentário dedicado à conturbada vida e obra do cantor, Donny Hathaway – Unsung, produzido este ano pela TV One.

Em sua breve e intensa carreira (1970-1979), Hathaway emprestou sofisticação harmônica à simplicidade do r&b. Seu legado extravasa o punhado de hits em paradas de sucesso e o balizamento favorável da crítica para os três álbuns solo que compõem sua trajetória. Filha mais velha do músico, a cantora Lalah Hathaway encontra dificuldades em mensurar o legado das contribuições musicais de seu pai. E ainda mais para avaliar a influência que a sua música ainda causa nos jovens artistas que o citam como influência – Amy Winehouse, Alicia Keys, Raul Midon, Justin Timberlake, rappers como Common, Nas e muitos outros. 
– É impossível avaliar a sua importância e influência no trabalho desses artistas. Acho que o maior legado é o sentido espiritual que ele representou – acredita Lalah. – Quando ouvimos suas canções podemos sentir o que se passava com ele em cada um de seus trabalhos. As pessoas não se cansam de dizer que a voz do meu pai faz chorar, mesmo nas canções mais alegres. Tanto a sua alegria como a sua dor brilham da mesma forma, sempre por uma essência verdadeira.
Em 1945, a Segunda Guerra Mundial havia chegado ao fim, os soldados americanos retornavam para casa e Donny Hathaway nascia em Chicago. Filho de um ex-militar, foi criado em St. Louis, por sua mãe. Lá, desde pequeno acompanhava as apresentações de sua avó, uma respeitada cantora gospel. Prodígio, aos 4 anos já estampava sua figura rechonchuda em cartazes. Aos poucos, suas habilidades como instrumentista e cantor saltaram aos olhos dos colegas de escola, e lhe renderam uma bolsa na prestigiada Howard University, que abrigava afro-descendentes sem restrição, numa época de grande segregação racial. O reconhecimento dos colegas lhe emprestava confiança para deixar de lado a timidez. E inclusive para render-se ao primeiro amor, a vocalista Eulaulah Hathaway. Era meados dos anos 60, a cena musical e noturna de Washington tronava-se elétrica e faminta por jovens talentos – e Hatahaway aproveitava as oportunidades.
Pouco tempo depois, em 1967, ganhava sua primeira filha, Lalah. A responsabilidade batia à porta. E um novo emprego surge como um presente de outra lenda da música black, Curtis Mayfield. Pelo selo de Mayfield, gravou alguns singles e discos, antes de retornar a Chicago para compor e produzir artistas como The Staple Singers, entre outros nomes contratados por gravadoras lendárias, como Chess e Stax Records. A consistência das ideias, a fluidez das composições e a criatividade dos arranjos tecidos em estúdio chamaram a atenção de Roberta Flack, que debutava com duas canções de Hathaway no repertório. Após prensar o single The ghetto, com o Rick Power Trio, sua musicalidade fisgou medalhões do mercado. Entre ele, King Curtis, que o pôs em contato com o diretor artístico e executivo da Atlantic Records, Jerry Wexler (1917-2008).
“Curtis jogou na minha mesa uma fita desse cantor... Fiquei impressionado com o que ouvi. Àquela época costumava dizer que tínhamos dois gênios, Aretha Franklin e Ray Charles. Mas quando Donny surgiu e assinamos contrato fiz questão de anunciar a todos que tínhamos encontrado o nosso grande gênio”, disse Wexler à época.
Sob o guarda-chuva da Atlantic, artistas de peso receberam guarida. Wexler fora o responsável por descobrir e fechar acordos milionários com Ray Charles, Aretha Franklin, Led Zeppelin, Wilson Pickett, Dusty Springfield, entre outros. Em 1969, era chegada a hora de Hathaway, que fez as malas e foi a Nova York gravar seu debute. Escreveu arranjos e compôs todas as faixas de Everything is everything.
“Donny tinha um dom fora do normal. Era perfeccionista e sabia muito bem o que queria. Tudo estava escrito na pauta. Lembro de uma sessão em que ele passou horas repetindo a mesma parte até que soasse da forma como imaginava”, conta Wexler.
Após a boa receptividade do disco e a gravação do hit The Christmas, Hathaway terminou o segundo álbum, auto-intitulado Donny Hathaway. Capitaneado pelo antológico single A song for you e pela bela faixa de abertura, Givin up, o trabalho foi elogiado pela crítica.

– Giving up é uma das maiores canções já feitas – elogia, em entrevista ao Jornal do Brasil, a jovem e talentosa cantora inglesa Joss Stone. – Donny tem controle total sobre todas as etapas do processo. Não há espaço para acidentes, erros… Ele é brilhante e me faz sentir bem demais sempre que ouço suas músicas.

Em 1972, após o nascimento de sua segunda filha, Kenya, Donny uniu forças com Roberta Flack para um álbum recheado de clássicos, interpretados em duetos. O trabalho bateu o terceiro lugar nas paradas e o single Where's the love recebeu uma indicação ao Grammy. Inúmeras propostas e convites para produção de discos e encomendas de canções não paravam de chegar. E o mercado cinematográfico não ficou para trás. Com supervisão de Quincy Jones, foi escalado para compor a trilha para o longa Come back, Charleston blue(1972). “Eu era o supervisor geral do filme e os estúdios pediram que eu gravasse com o melhor compositor que eu conhecia. O mais incrível de eles era ele”, disse Quincy Jones.

Na mesma progressão em que florescia o sucesso, era aplacado por um comportamento irascível, que estranhava até aos amigos mais próximos. Em casa, sintonizava a TV em canais que não transmitiam programa algum. No estúdio, explosões de irritabilidade eram constantes. Enquanto empresários e produtores diziam que tudo estava sob controle, era claro que algo a mais precisava ser feito. “Procurei ajuda médica para saber se realmente havia algo de errado”, revela sua ex-mulher no documentário.
O diagnóstico era claro: paranoia esquizofrênica. Hathaway acreditava que a sua filha Lalah podia enxergar o que se passava dentro dele. Mania de perseguição, crises de ansiedade e de pânico eram mantidas sob controle à base de pesados medicamentos. Aos poucos, sentia-se melhor e deixava o tratamento de lado. A doença permanecia como uma sombra. Em 1973, o lançamento de sua obra derradeira, Extension of a man, não obteve o sucesso alcançado anteriormente. Conforme os sintomas pioravam, ficava mais difícil de ignorar o que acontecia com ele. “Fui visitá-lo no hospital e percebi mudanças repentinas de humor”, afirma o compositor Glen Watts.

De 1974 a 1978, Donny desapareceu da mídia. Perdeu contatos no mercado e rompeu o relacionamento com Eulaulah. Suas pequenas filhas deixaram de ter contato com o pai. E até hoje Lalah lembra-se pouco dos momentos em que estiveram juntos.
– Não lembro direito de como era o meu pai. Tinha apenas seis ou sete anos à época – diz ela.
Em 1978, a febre disco tomava conta das pistas e das rádios. Muitos de seus contemporâneos, entre eles Stevie Wonder e Marvin Gaye, adequavam-se à nova sonoridade, enquanto Hathaway esforçava-se para transpor cinco anos de sofrimento psíquico e obscuridade. Voltou a trabalhar com Roberta Flack, e com ela ganhou força a bordo do hit The closer I get to you. Iniciaram as gravações de um segundo trabalho em dupla. Seus vocais continuavam sólidos, mas seu estado físico e mental eram visivelmente frágeis. Enquanto punha voz numa das faixas, desesperou-se. Saiu correndo do estúdio e foi encontrado chorando no corredor. Dizia estar sendo perseguido e ameaçado de morte. “Os homens brancos querem me matar. Colocaram meu cérebro numa máquina e agora estão roubando minha música e o meu som”, dizia. Na manhã seguinte ao surto, aos 34 anos, sua vida ganhava o ponto final.


FONTE: JB

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Construção midiática da depressão
















Pesquisa conclui que o aumento expressivo da palavra ‘depressão’ na mídia brasileira foi acompanhado por uma ruptura de seu sentido na década de 1990.
 “Não há um dia em que a palavra ‘depressão’ deixe de ser veiculada por um meio de comunicação brasileiro”, garante Ericson Saint Clair. Parece exagero, mas o trabalho do comunicólogo comprovou a inquietação que o motivou: “todos os dias há jornalistas que insinuam que seus leitores podem estar deprimidos.”
Mais do que inquietação, uma antipatia à superexposição do tema na mídia e sobretudo ao viés cientificista e prescritivo que a acompanhava levou o pesquisador à seguinte questão: “como a depressão tornou-se objeto de atenção midiática?”, a qual buscou responder em seu doutorado na Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Com base na análise de uma amostra expressiva da imprensa brasileira, Saint Clair não só observou nesse meio um vertiginoso aumento das referências à depressão nas últimas décadas, como também uma ruptura radical de sentido que a palavra sofreu nos anos 1990.
De um mal coletivo, reflexo das agruras sociais, políticas e econômicas do Brasil, especialmente durante a ditadura militar, a depressão passaria a ser compreendida a partir desse período como um mal privado, explicado objetivamente pela ciência e afastada do contexto sociocultural do país.
O comunicólogo atribui essa cisão a uma série de fatores, entre eles o desenvolvimento de novas formas de diagnóstico e tratamento da depressão e a significativa relevância conquistada pelo tema da saúde, tida, especialmente a partir da década de 1990, como uma responsabilidade individual. 
“A mídia passa a adotar um tom claramente
 pedagógico, encorajando seus leitores
 à modificação de seus comportamentos diante
 das ‘verdades descobertas’ pela ciência”
Saint Clair observou ainda que, com o novo sentido midiático da depressão, veio uma reconfiguração da função social que os meios de comunicação reivindicam para si em relação ao problema.
Enquanto nos anos 1970 e 1980 a cobertura sobre depressão era uma maneira de denunciar as formas de dominação política e econômica do governo, a partir de 1990 ela assumiria a tarefa de fornecer informações científicas sobre o tema e promover mudanças de comportamento. “A mídia passa a adotar um tom claramente pedagógico, encorajando seus leitores à modificação de seus comportamentos diante das ‘verdades descobertas’ pela ciência”, analisa o pesquisador.

Depressão na imprensa

Para analisar a trajetória da depressão na imprensa brasileira, Ericson Saint Clair acompanhou quatro décadas (1970-2010) de textos do jornal Folha de São Paulo e da revista Veja em que a palavra ‘depressão’ com sentido psíquico (médico ou não) foi mencionada, independentemente das editorias em que se deram essas menções.
“São dois veículos que geram grande impacto no cenário cultural brasileiro há décadas”, afirma o pesquisador, justificando a escolha das publicações. “Além disso, tem a facilidade metodológica: a Veja e a Folha disponibilizam os arquivos digitalizados de suas edições antigas em seus sites.”
No total, foram avaliados 863 textos segundo uma série de categorias, entre elas a editoria em que a matéria fora publicada, fontes citadas, se a depressão é o tema principal da matéria e qual é o sentido dessa palavra nela – transtorno ou distúrbio, doença ou outra classificação. 

Sentidos para a depressão

Segundo Saint Clair, a palavra ‘depressão’ vem do termo latino depressare, que significa ‘pressão para baixo’. Essa definição pode ter desde o sentido de depressão física, até de depressão econômica ou de depressão geológica.
No caso da amostra analisada, a palavra ‘depressão’ é usada, entre as décadas de 1970 e 1990, majoritariamente como referência às mazelas socioeconômicas do país. “Mas mesmo com esse sentido, a palavra também estava atrelada a uma questão política, não apenas por conta da ditadura, mas por causa do questionamento que a crise da economia gerava em relação ao regime”, explica o pesquisador. “Havia, assim, os ‘deprimidos’, como os políticos exilados, cassados e desempregados, e a ‘depressão’ do Brasil como um todo, nesse cenário de flagelo sociocultural e político”, completa.
Foi só no começo da década de 1990, como Saint Clair mostra em sua tese, que o termo passou a adquirir o sentido mais recorrente na imprensa atual. Na maioria de suas aparições a partir desse período, depressão designa um transtorno psíquico passível de instrumentalização por saberes técnicos especializados.
Desde que iniciou a pesquisa, o comunicólogo dispõe de uma ferramenta on-line que o alerta para a menção da palavra ‘depressão’ em sites de jornais, revistas e em blogues. Isto vem lhe permitindo computar a ocorrência diária do termo e observar os usos e sentidos da palavra nesses meios. 
Mesmo o sentido médico da palavra tem
 sido extrapolado na sociedade brasileira,
 que a evoca para falar das diferentes 
formas de experiência do sofrimento
O pesquisador destaca que mesmo o sentido médico e científico da palavra, predominante na mídia hoje, tem sido extrapolado na sociedade brasileira, que a evoca cada vez mais para falar das diferentes formas de experiência do sofrimento. “A utilização banalizada da palavra ‘depressão’ como transtorno mental parece-nos um relevante sintoma da incapacidade de uma cultura de simbolizar afetos tristes em geral sem apelar para uma concepção estritamente técnica e pragmática das manifestações de tristeza humana”, ressalta.
Atualmente Saint Clair dá continuidade à pesquisa em seu pós-doutorado na UFRJ, no qual ele trata não apenas da depressão, mas também de outros distúrbios psiquiátricos. “Agora eu passo a acompanhar como vem se dando a produção de sentido na mídia acerca de diversos outros transtornos psíquicos”, completa.

FONTE: Déborah Araujo / Ciência Hoje On-line

terça-feira, 14 de maio de 2013

Transtornos mentais podem estar ligados às pressões no trabalho, aponta estudo da USP

















Um estudo da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo) mostrou de que forma os transtornos mentais podem estar ligados a pressões impostas no ambiente de trabalho. Esta é a terceira razão de afastamento de trabalhadores pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).

O coordenador da pesquisa, o médico do trabalho João Silvestre da Silva-Júnior, trabalha como perito da Previdência Social há seis anos e, tendo observado a grande ocorrência de afastamentos por causas ligadas ao comportamento, decidiu investigar o que tem provocado distúrbios psicológicos.


O cientista notou que a violência no trabalho ocorre pela humilhação, perseguição, além de agressões físicas e verbais e listou quatro razões principais que prejudicam a saúde mental no ambiente corporativo.

A primeira delas é a alta demanda de trabalho. “As pessoas têm baixo controle sob o seu ritmo de trabalho; elas são solicitadas a várias e complexas tarefas”, disse o pesquisador. O outro aspecto são os relacionamentos interpessoais ruins, tanto verticais (com os chefes), quanto horizontais (entre os próprios colegas).

A terceira razão é o desequilíbrio entre esforço e recompensa. “Você se dedica ao trabalho, mas não tem uma recompensa adequada à dedicação. A gente não fala só de dinheiro. Às vezes, um reconhecimento, um elogio ao que você está desempenhando”, explica Silvestre. O último aspecto citado pelo pesquisador é a dedicação excessiva ao trabalho, que também pode afetar a saúde mental.

A pesquisa coletou dados na unidade de maior volume de atendimentos do INSS da capital paulista, a Glicério. Foram ouvidas 160 pessoas com algum tipo de transtorno mental. Silvestre informa que, entre as pessoas que pediram o auxílio doença nos últimos quatro anos, uma média de 10% apresentava algum tipo de transtorno.

Segundo o Anuário Estatístico da Previdência Social de 2011, mais de 211 mil pessoas foram afastadas em razão de transtornos mentais, gerando um gasto de R$ 213 milhões em pagamentos de benefícios. “Quando você entende o que gera os afastamentos, você pode estabelecer medidas para evitar os gastos”, disse. As doenças mentais só perderam, naquele ano, para afastamentos por sequelas de causas externas, como acidentes, e por doenças ortopédicas.

Em São Paulo, a pesquisa constatou a alta presença de trabalhadores do setor de serviços, como operadores de teleatendimento, profissionais da limpeza e da saúde com doenças mentais. “Mas essa variável do tipo de trabalho não se apresentou significativa no nosso estudo. Ela não apareceu como algo que influencia o aparecimento do transtorno mental incapacitante”, relata.

A pesquisa apontou que o perfil predominante entre os afastamentos foi o feminino e alta escolaridade (mais de 11 anos de estudo). Mas Silvestre alerta para uma distorção, porque as mulheres têm maior cuidado com a saúde, o que aumenta a presença feminina nas estatísticas.

“O sexo feminino apresentar uma maior possibilidade de transtorno mental está relacionado às mulheres terem facilidade em relatar queixas. Reconhece-se que as mulheres procuram os médicos com mais facilidade, elas têm uma maior preocupação com a saúde do que os homens”, contou. De acordo com o cientista, os homens demoram a ir ao médico e, quando vão, encontram-se em situação mais grave.

O fator escolaridade, segundo o estudo, pode afetar a percepção da existência das doenças. A maioria dos afastamentos ocorre com indivíduos de alta escolaridade, pois eles são mais esclarecidos. “As pessoas conseguem ter uma maior percepção de que o ambiente de trabalho está sendo opressor. Quando ela percebe que ali é um local ruim de trabalhar, ela vem a adoecer, a ter o distúrbio psicológico e termina se afastando”, disse.

Para melhorar o clima no trabalho e prevenir doenças, Silvestre recomenda que os profissionais ligados à saúde e segurança do trabalho das empresas tenham consciência sobre onde estão os fatores de risco. Ele sugere também uma melhora da fiscalização por parte dos ministérios do Trabalho e da Saúde.

FONTE: AGÊNCIA BRASIL / Fernanda Cruz

‘Infeliz, nunca fui; eu fiquei doente’, afirma Paula Fernandes












Cantora teve depressão na adolescência e faz terapia até os dias de hoje.


“É um choro que não cessa, um sono e um apetite que não voltam”.  Quem vê Paula Fernandes nos palcos nunca imaginaria que essa era a sua rotina na adolescência.

A cantora teve depressão e não acreditava que uma menina de 17 anos poderia estar com a doença.  Durante o período de dois a três anos, Paula deu um tempo na carreira musical e até chegou a fazer um curso de secretariado. Além da depressão, ela também tinha crises de pânico e o simples barulho de uma sirene já lhe provocava medo.

A depressão tem como sintomas a falta de prazer e o sentimento de tristeza profunda. Foi assim que Paula começou a saber que algo estava errado. “Percebi que alguma coisa não estava bem, perdi o apetite, quase não dormia, chorava muito e vivia angustiada”, disse, em entrevista por telefone ao Fantástico, depois de saber que o programa trataria dessa doença no quadro “Males da Alma”.

Paula acredita que teve depressão por causa de seu estilo de vida quando muito jovem. “Eu não fui uma menina comum. Em vez de ir às festinhas, eu era o evento. Eu sentia falta de algo que não sabia o que era. Me relacionar com as pessoas, ter um namorado. Eu não culpo ninguém, mas foi uma consequência das minhas escolhas pela carreira”, contou.

Paula começou a investir na carreira musical aos oito anos e recebeu muitos ‘não’ no começo. Durante a adolescência, a falta de uma vida considerada ‘normal’ pesou e a cantora teve depressão aos 16. “A primeira lembrança que eu tenho é de quando eu tinha 16 anos e comecei a ter uma pequena arritmia. Ninguém acreditava que isso poderia ser sintoma de uma crise de pânico”, conta.

Depois de aceitar o tratamento, Paula começou a tomar os remédios.  “A fase mais difícil é a que você está ignorante sobre o que está sentindo. Acha que vai morrer e não sabe o que está acontecendo. 

Outra fase é a em que você começa a melhorar, mas não acredita nisso até tomar confiança”, disse.
A cantora deixou o quadro depressivo há cerca de dez anos, mas até hoje faz terapia e se preocupa em manter uma vida saudável. Para ela, o mais importante é acabar com o preconceito e assumir a doença.

“Para aquelas que desconfiam, a primeira coisa que tem que fazer é perder o preconceito. E para aquelas que já descobriram, é continuar o tratamento. O preconceito é o maior dos problemas. Qualquer pessoa pode ter depressão e muita gente jura de pé junto que não tem. Isso é um dos maiores problemas!”, disse.

Se Paula não tivesse aceitado o tratamento, as coisas poderiam ser diferentes, segundo ela. “Eu não estaria aqui, teria feito alguma bobagem”, conta. A cantora também afirma que nunca pensou em se matar: “Eu nunca teria coragem, e uma coisa que não perdi foi a consciência”.

Hoje, ela considera que a doença foi um impulso na carreira e serviu de fortalecimento. “Infeliz, nunca fui; eu fiquei doente”, afirmou.



 FONTE: FANTÁSTICO / REDE GLOBO / PERLA RODRIGUES

sábado, 11 de maio de 2013

DEPRESSÃO INFANTIL E NA ADOLESCÊNCIA













A palavra depressão é usada com grande liberdade. Basta um pequeno problema, uma desfeita, um desencontro emocional, um prejuízo financeiro, para nos declararmos deprimidos. Embora seja empregada como sinônimo de tristeza, tem pouco a ver com esse sentimento.
Depressão é uma doença grave. Se não for tratada adequadamente, interfere no dia a dia das pessoas e compromete a qualidade de vida. Nos adultos, é mais fácil de ser diagnosticada. Eles se queixam e, mesmo que não o façam, suas atitudes revelam que não se sentem bem e a família percebe que algo de errado está acontecendo. Com as crianças, é diferente. Elas aceitam a depressão como fato natural, próprio de seu jeito de ser. Embora estejam sofrendo, não sabem que aqueles sintomas são resultado de uma doença e que podem ser aliviados. Calam-se, retraem-se e os pais, de modo geral, custam a dar conta de que o filho precisa de ajuda.
SINAIS DA DEPRESSÃO INFANTIL

Drauzio  Quais são os sinais de depressão que devem ser observados na criança, uma vez que ela não reconhece que está deprimida?

Sandra Scivoletto – A criança tem grande dificuldade para expressar que está deprimida. Primeiro, porque não sabe nomear as próprias emoções. Depende do adulto para dar o significado daquilo que se chama tristeza, ansiedade, angústia. Por isso, tende a somatizar o sofrimento e queixa-se de problemas físicos, porque é mais fácil explicar males concretos, orgânicos, do que um de caráter emocional.

Alguns aspectos do comportamento infantil podem revelar que a depressão está instalada. Por natureza, a criança está sempre em atividade, explorando o ambiente, querendo descobrir coisas novas. Quando se sente insegura, retrai-se e o desejo de exploração do ambiente desaparece. Por isso, é preciso estar atento quando ela começa a ficar quieta, parada, com muito medo de separar-se das pessoas que lhe servem de referência, como o pai, a mãe ou o cuidador. Outro ponto importante a ser observado é a qualidade de sono que muda muito nos quadros depressivos.
O que se tem percebido nos últimos anos é que a depressão, na infância, caracteriza-se pela associação de vários sintomas que vão além da ansiedade de separação manifesta quando a criança começa a frequentar a escola, por exemplo, e incluem até de medo de comer e a escolha dos alimentos passa a ser seletiva.
Portanto, a criança pode estar dando sinais de depressão quando a ansiedade de separação persiste e ela reclama o tempo todo de dores de cabeça ou de barriga, nunca demonstrando que está bem.
Drauzio – Quais são as características do sono da criança deprimida?

Sandra Scivolletto – Na depressão infantil, o sono começa a ser interrompido por pesadelos e o medo de ficar sozinha faz com que reclame e chore muito na hora de dormir. Não é o choro de quem quer continuar brincando. É um choro assustado, indicativo do medo que está sentindo o tempo todo.

Drauzio – Quando os quadros de depressão passaram a ser reconhecidos na infância?

Sandra Scivoletto – O reconhecimento da depressão na infância é relativamente recente na psiquiatria, justamente pela dificuldade que a criança tem de referir-se ao que sente. Por isso, muitas vezes, era considerada portadora de fobias específicas, tais como os transtornos comportamentais e a ansiedade de separação. Foi só há mais ou menos 20 anos, que a doença passou a ser reconhecida em adolescentes, uma vez sua forma de expressão é diferente da dos adultos.

DIAGNÓSTICO

Drauzio – Como você diferencia a depressão dos distúrbios de hiperatividade e atenção?

Sandra Scivoletto – Na criança, é bem fácil diferenciar a hiperatividade da depressão. Criança hiperativa não para quieta, mexe-se o tempo todo, principalmente os meninos. Entretanto, existe um subtipo de hiperatividade que se caracteriza pela desatenção. A criança não é hiperativa fisicamente, mas não consegue focar a atenção, por isso se retrai e vai abandonando as atividades. Muitos a consideram desligada, mas ninguém a considera uma criança triste.

Ao contrário, criança deprimida logo demonstra que não se interessa por nada e não há brincadeira que a faça sentir-se melhor. Fica parada o tempo todo e quer sempre alguém em que confie por perto.
Drauzio – Crianças deprimidas perdem a iniciativa?

Sandra Scivoletto – Perdem a iniciativa e deixam de aprender. Na escola, apresentam várias dificuldades de aprendizado e, num primeiro momento, são encaminhadas para a avaliação do oftalmologista, do otorrino, da fonoaudióloga. Passam também por testes específicos para o déficit de atenção e hiperatividade. No passado, o diagnóstico de depressão era feito por exclusão. Hoje se sabe que sintomas como alterações do apetite e do sono, diminuição da atividade física, medo excessivo, duradouro e persistente, são próprios da depressão infantil.


FATORES DE RISCO 

Drauzio – Existem fatores desencadeantes que aumentam o risco de quadros depressivos nas crianças?

Sandra Scivoletto – Existem. Como nos adultos, luto, perdas, separação dos pais, dificuldade de adaptação a situações novas, mudança de escola e de domicílio podem gerar estresse, que vai desgastando a criança e conduzindo a um quadro depressivo. No entanto, na maioria dos casos, existe um componente hereditário, genético, mais significativo do que nos adultos, responsável pelo desencadear quadros de depressão na criança.

Drauzio – Filhos de pais depressivos ou com parentes próximos com quadros de depressão correm maior risco de apresentar o problema?

Sandra Scivoletto – Correm, e a depressão que se inicia na infância, geralmente, é mais grave. Por isso, a criança deve ser tratada o mais rápido possível.

Drauzio – Qual é o inconveniente de não diagnosticar a doença e não iniciar o tratamento precocemente?

Sandra Scivoletto – Primeiro, a dificuldade de aprendizado é grande. Depois, a criança vai crescer achando que a alegria estampada nas outras pessoas não foi feita para ela e conforma-se com esse referencial. Mais tarde, quando adolescente, estará mais propensa ao uso de drogas, porque irá procurar alguma coisa que alivie esse desconforto permanente. Não é possível que só os outros consigam ser felizes.

Drauzio – Num primeiro momento, as drogas fazem isso num piscar de olhos…

Sandra Scivoletto - Juntar o imediatismo próprio do adolescente com o alívio momentâneo que a droga dá é um caminho que passa a falsa impressão de que o problema está resolvido. Isso torna a situação mais difícil ainda. Quando ouve que deve abandonar o uso de droga, ele argumenta: “Logo agora que estou me sentindo bem e sem a droga passo mal?”.

Drauzio – Nos adultos, a estimativa é que para os quadros depressivos sejam mais frequentes nas mulheres (três mulheres para cada homem). Nas crianças, essa diferença entre os sexos também existe?

Sandra Scivoletto – Na infância, a ocorrência de depressão é praticamente igual nos dois sexos. A diferenciação começa na adolescência, fase em que as meninas são mais vulneráveis. Sem dúvida, a questão hormonal interfere consideravelmente nesse processo.

SINAIS NA ADOLESCÊNCIA 

Drauzio – Existe alguma diferença entre o quadro clínico da depressão infantil e da depressão na adolescência?

Sandra Scivoletto – Existe, principalmente nos meninos, até por fatores culturais. O menino não internaliza as emoções como a menina, que se tranca no quarto e chora. Ele se torna extremamente agressivo, fica na defensiva o tempo todo e sai brigando com o mundo.

Basta alguém lhe dizer bom-dia, para achar que o estão acusando de alguma coisa. Rebelde e desafiador, está permanentemente em confronto. Cria problemas na escola, em casa e entra em conflito com as figuras hierárquicas. Irrita-se com muita facilidade e essas reações, às vezes, são confundidas com algum transtorno de comportamento. Quando se fala aos pais que ele está deprimido, eles reagem: “Como? Se ele tem uma energia para brigar que não tem fim?”.
Na realidade, o adolescente deprimido age como se a melhor defesa fosse o ataque e, se conseguimos ultrapassar essa barreira, ele se mostra muito angustiado e chora.
Drauzio – Pensando na minha infância, na infância de minhas filhas e das crianças que vi crescer, acho que toda criança tem fases em que se mostram mais quietas e caladas e, às vezes, apresentam dificuldade de adaptação na escola. O limite entre o que acontece com a criança sem maiores problemas e as que têm distúrbios mais sérios é muito sutil. O que deve ser valorizado nesses casos?

Sandra Scivoletto – Crescer é doloroso. Só crescemos quando o incômodo é maior do que o medo da mudança. Aí, tomamos coragem e damos um salto. Isso acontece ao longo da vida e na infância inteira. A criança tem medo de dormir fora de casa, mas, convidada por um amigo, pensa – “Se eu não for porque estou com medo, não vou poder brincar com meu amigo” – e a vontade de estar com ele supera o medo. A criança deprimida não tem essa vontade e, consequentemente, não encara os desafios. Retomando as reações da criança normal, diante da dificuldade ela se retrai, fica mais quieta. É um comportamento de proteção, desejável, que evita situações de maior risco. Entretanto, a partir do momento em que se sente mais confiante, encara e vence o obstáculo. Isso é motivo de enorme alegria que a ajuda a fortalecer a autoestima e a aumentar a autoconfiança.

A criança deprimida não dá esse salto. Aliás, não tem autoestima, sente-se permanentemente incapaz, não enfrenta desafios. Como é mais difícil desistir do que tentar, vai sofrendo um afunilamento das atividades.
A adolescência é uma fase de crises, mas de crises extremamente breves, fugazes. No mesmo dia, pela manhã, o adolescente é a pessoa mais infeliz do mundo e, à noite, o mais alegre, porque conseguiu enfrentar e resolver os problemas que o afligiam. No deprimido, o processo da crise é longo, permanente.
REAÇÃO DOS PAIS 

Drauzio – Respeitadas as diferenças de cada família, como costuma ser o comportamento dos pais diante de um filho com depressão?

Sandra Scivoletto – A primeira reação, principalmente se existem outros filhos, é de alívio. “Que bom, como ele é quietinho, não dá trabalho nenhum!”, eles dizem, porque durante o dia não demanda atenção, fica quietinho no seu canto. Todavia, à noite, quando afloram os medos, ele começa a incomodar, porque não quer ficar sozinho, nem deixa os pais saírem de perto. Geralmente, essa dificuldade de desligar-se acaba gerando conflito entre os cônjuges. O pai acha que a mãe está superprotegendo a criança, que está cada vez mais mimada.

O que acontece com a maioria dos filhos? Longe dos pais, da mãe principalmente, eles são ótimos, alegres, comunicativos. Já a criança deprimida fica quietinha num canto, não brinca. Não é que seja muito agarrada à mãe. Mesmo longe dela, mostra-se retraída, quieta.
Os pais têm enorme resistência em entender esse comportamento como doença. A primeira leitura é interpretá-lo como erro de criação e sentem-se culpados. Na grande maioria dos casos, a criança é encaminhada para psicólogos e só depois de um ou dois anos, quando a terapia não resolveu, é que procuram outro profissional.
Drauzio – Como vocês lidam com esses casos?

Sandra Scivoletto - Temos trabalhado muito no sentido de sair do consultório e do ambiente hospitalar para atuar nas escolas com os professores. São eles as pessoas mais capacitadas, não para o diagnóstico, mas para traçarem uma avaliação do comportamento da criança. Os pais estão emocionalmente envolvidos e fica difícil para eles assumir essa tarefa.

SUICÍDIO 

Drauzio – Muitos adolescentes se suicidam, às vezes, por motivo aparentemente banal, mas no fundo, por trás desse gesto, está a depressão. Quadros de depressão não reconhecida e não tratada podem levar a extremos como esse?

Sandra Scivoletto – Felizmente, o suicídio infantil é raro, porque a criança tem uma visão diferente da morte. Não a vê como fim do sofrimento. É como se fosse um sono do qual acordará depois.

Na infância, o mais comum é surgir um comportamento que chamamos de parassuicida. Acidentes podem acontecer com todas as crianças, mas com a criança deprimida são frequentes, porque ela não se protege, cai da árvore, é atropelada, arrebenta-se andando de bicicleta. Mal se refez de um, está metida em outro acidente. Parece que nunca aprende a resguardar-se.
Na adolescência, a intensidade dos sentimentos e emoções aumenta. Adolescentes são mais imediatistas e querem resolver rápido a situação que tanto os incomoda. Por isso, num impulso, em momentos de extrema angústia, cometem suicídio. É muito difícil perceber neles uma ideação suicida estruturada e planejada ao longo do tempo.
O que se tem notado, nessa faixa de idade, é a tendência ao envolvimento com gangues. Dão a impressão de que se sentem atraídos pela ideia de morte e, como não têm coragem para matar-se, enredam-se em situações em que um tiro disparado por outra pessoa, será a melhor solução para o problema, já que não têm nada a perder.
TRATAMENTO

Drauzio – No tratamento das crianças com depressão há sempre necessidade do uso de medicamentos?

Sandra Scivoletto – Não. Na infância, conseguimos controlar alguns casos leves e reconhecidos precocemente com psicoterapia e a orientação dos pais. Entretanto, como a depressão tem um componente genético muito forte, em certos casos, a necessidade de medicação torna-se quase compulsória.

Drauzio – Como nos adultos, a medicação precisa ser usada por bastante tempo?

Sandra Scivoletto – Não. Felizmente, a criança responde muito mais depressa aos medicamentos do que o adulto e, quanto menor for o tempo de uso da medicação, melhor. O que se faz, nesses casos, é indicar um antidepressivo numa dose a mais baixa possível até a criança começar a apresentar o comportamento esperado para a idade. Isso demora uns dois meses aproximadamente. Sedimentado esse comportamento, suspende-se o remédio, mas tanto a introdução, quanto sua retirada, são feitas aos poucos, lentamente.

Drauzio – Às vezes, comentários na imprensa leiga sugerem que alguns medicamentos para a depressão infantil aumentariam a ocorrência de suicídios. Existe alguma relação cientificamente comprovada nesse sentido?

Sandra Scivoletto – O que acontece é que adolescentes muito deprimidos pensam em morrer, mas a depressão é tão intensa que eles não têm o impulso para tentar o suicídio. Quando começam o tratamento para a depressão, o que primeiro melhora é a iniciativa e não o humor. Não é que o antidepressivo tenha um efeito colateral que leve ao suicídio. Não, infelizmente o humor é a última coisa que melhora.

Por isso, insistimos em que ninguém pode usar antidepressivos sem ser acompanhado de perto por um médico, porque é preciso reconhecer o momento em que há essa passagem ocorre e redobrar a atenção.

FONTE: Sandra Scivoletto é médica psiquiatra, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, coordenadora do Grupo de Estudos Álcool e Drogas e responsável pelo Ambulatório de Adolescentes do Hospital das Clínicas da FMUSP